30 janeiro, 2025

vitória e queda

 
VITÓRIA
(um palíndromo de asas quebradas)
 
A
mérica —  
engrenagens de números  
paridos em stock
(um relógio mastiga  
sombras com veias de cobre)  
< >
CH
ina —  
um dragão de circuitos  
tece raízes  
em telhas de arroz  
(no ecrã:  
mãos sem rosto  
desenham  
um sol quadrangular)  
 
V
entos colidem:  
o $ engole o seu próprio rabo  
enquanto a tinta  
—vermelha—  
floresce em raízes de silício  
I
sto não é uma metáfora.  
É um algoritmo  
a sangrar hexágonos  
no mapa-múndi  
desdobrado em  
**Ó**  
**R**  
**I**  
**A**  
 
(nota: a luz vaza  
pelos furos do código  
— uma Fénix de fibra óptica  
rompe o teclado  
e canta  
em língua de pássaro binário)
 
 
 
Queda
 
O abutre de aço tropeça em livros abertos —  
Na sua asa cravaram versos em vez de balas.  
Monumentos de cifras são engolidos por ervas-daninhas,  
e o sopro das bibliotecas derruba as cercas de arame.  
 
No chão, os dólares ardem como papel de parede velho,  
e o silêncio dos canhões é um caderno em branco
onde as crianças pintam auroras.  
A estátua que um dia ergueu a fome
agora é um esqueleto —  
 
enquanto pulsos sem relógios
plantam antenas de bambu  
no crânio rachado do capital,  
e a terra ávida,  
desenha com enxadas
o rosto dos que sabem
ferver água com sol.
 
 
Fátima Vale